Mar interminável
Na página 642 de 2666, lê-se:
«Viver neste deserto, pensou Lalo Cura enquanto o carro conduzido por Epifanio se afastava do descampado, é como viver no mar. A fronteira entre Sonora e o Arizona é um grupo de ilhas fantasmagóricas ou encantadas. As cidades e as aldeias são barcos. O deserto é um mar interminável. Este é um bom sítio para os peixes, sobretudo para os peixes que vivem nas fossas mais profundas, não para os homens.»
O deserto é um mar interminável, sim. Como o próprio livro que o descreve.
Comentários
4 Responses to “Mar interminável”
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 29 de Dezembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 22 de Dezembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 16 de Dezembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 9 de Dezembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 2 de Dezembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 25 de Novembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 18 de Novembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 11 de Novembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 4 de Novembro de 2016
- Amanhã na secção de Livros da revista ‘E’ em 28 de Outubro de 2016
Acho que essa leitura titânica começa a fazer mossa… esse último comentário soa um pouco passivo-agressivo 😛
«A substância do deserto é a do mar, que dele difere apenas pelo grau de apuramento. O mar surge no termo dum processo em que o deserto é uma das fases ou, mais concretamente, a sua cristalização. Se se atender a que no lugar onde o apuramento se produz é o nosso espírito, não poderão causar qualquer estranheza factos como, por exemplo, o de a presença do deserto ser notada por quem, como os marinheiros, tenha um íntimo contacto com o mar.»
Excerto de “Os rostos náufragos” em ” O céu sob as entranhas de Luís Miguel Nava
Li o livro de Bolaño na língua em que foi escrito, o castelhano, e perguntei-me imediatamente como se iria chamar Lalo Cura na versão portuguesa. Aqui está um caso em que se perde na tradução. Desaparece o jogo de palavras do nome da personagem. Ainda por cima numa matéria sensível e determinante (embora, num daqueles golpes de humor típicos de Bolaño, Lalo Cura seja uma das personagens menos «locas» do romance). Se tivesse de escolher «o» tema de 2666 diria sem dúvida que é um romance sobre a loucura. Que está por todo o lado, do princípio ao fim. Explícita, obsessiva, ameaçadora.
Concordo, Carlos.